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Henrique Agostinho
Henrique Agostinho
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As criptomoedas não servem para nada de evidente, não se comem, não se vestem e há dúvidas do valor intrínseco, são portanto tal e qual o dinheiro. Pois também o dinheiro não se pode comer, nem dá felicidade, mas em compensação, com dinheiro, pode-se comprar bolo de chocolate e, fica bem mais difícil estar triste, com bolo de chocolate.

Tal como o dinheiro, ou melhor, por serem dinheiro, as criptomoedas não servem para mais nada de especial a não ser para comprar, para pagar por coisas e, de uma forma bastante enervante para as pessoas que não entendem o dinheiro, esse singelo acto, de pagar, é super importante.

Pagar, significa mandar dinheiro de um lado para o outro, de uma pessoa para outra. O que, parecendo simples, que é, não é algo em que se possa facilitar. Para pagar a sério, (1) quem paga tem de ter o dinheiro, (2) quem recebe tem de ficar com ele, o (3) pagamento faz-se no prazo acordado, (4) nas condições esperadas, (5) sem poder voltar atrás e (6) sem haver mais gente pelo meio a meter o bedelho onde não é chamado. 

Todas aquelas condições somadas, são as características de um meio de pagamento eficaz e, na verdade, até à criação do Bitcoin, não havia nenhum meio de pagamento que cumprisse com todas elas. Especificamente, falhava a última das condições, já que todos os meios de pagamentos pré-Bitcoin dependem de um terceiro, tipicamente um governo, a meter o seu bedelho, ou seja, aprovar cada transação.

Uma vez criado o Bitcoin, com a sua inédita capacidade para realizar pagamentos, houve logo quem se pusesse a pensar em ir um bocado além e expandir a novidade para todas as actividades baseadas em pagamentos: Poupança, Empréstimos, Seguros, Câmbios, Apostas, Jogos, Títulos, Autenticação. A miríade dos serviços financeiros que, no sistema bancário tradicional, existem de forma atabalhoada, altamente custosa (para o contribuinte) e se tornarem passíveis de modernizar, graças à invenção de Satoshi Nakamoto.

Essas criações, agora chamadas de Defi, serviços financeiros descentralizados e não se lhes pode ignorar a criatividade. Para resolver de forma sistemática o que os bancos fazem de forma perigosamente manual, foram criadas aplicações computacionais, códigos informáticos, a bem dizer, engenhosos. Exemplos:

  • Smart Contracts – Trata-se da inclusão, dentro de uma operação de pagamento, de algumas condições adicionais, tornando a operação mais complexa, condicional. Na verdade, todas as operações listadas abaixo são tipos específicos de Smart Contracts.
  • Coin-join – Uma operação cruzada em que um pagamento numa rede é condicionado ao pagamento noutra rede. A solução técnica usada pelas Bolsas Centralizadas, CEX (como Mercado Bitcoin, Coinbase e a Criptoloja) para trocar entre vários tipos de moedas
  • Liquidity Pools – Um engenhoso sistema, para permitir a existência de Bolsas Descentralizadas, DEX (como Uniswap, DYDX2, Pancake Swap), em que fornecedores de liquidez assumem o risco de desvalorização de umas moedas sobre as outras, em troca de um fee de transação.
  • DAO – Decentralized Autonomous Organization. Processo, ou regras segundo as quais a própria rede pode operar ou até ser atualizada. 
  • Staking – A operação em que o proprietário de moedas participa da validação de transações numa rede “proof-of-stake”, recebendo os fees das transações e alguma inflação.
  • Tokens – Moedas que existem dentro de outras redes.
  • Oracles – Informação certificada para validar transações noutras redes. Por exemplo, datas, ou valores de mercados são comunicados entre redes através de oráculos.
  • Minting – Criação de moedas com comportamentos pré-definidos, por exemplo opções de compra (produtos derivados). Uma vez esgotada a sua utilidade, os tokens são destruídos, com uma operação chamada de Burn.
  • NFTs – Itens únicos que podem ser transacionados, mas não podem ser substituídos por outros equivalentes. 

A lista continua, até onde a imaginação puder levar e muitas re-utilizam pedaços de códigos já existentes para realizar novos smart-contracts mais complexos ou melhorados e são com isso responsáveis pelas mais de 20mil cripto-moedas em existência. O que leva a um cenário complicado e provavelmente o responsável pelo actual mau momento do mercado.

  1. As operações de smart-contracts tornam-se tão complicadas que não são “trustless”. A inovação primordial do Bitcoin é permitir pagamentos sem depender da confiança de terceiros. Quando um smart-contract fica muito complicado, ninguém sabe verdadeiramente dizer do que ele é capaz, ficando os utilizadores obrigados a confiar na boa vontade do programador original.
  2. A dispersão de moedas e regras faz com que muitas sejam controladas por poucas pessoas, não chegando a ser “descentralizadas”. Ninguém controla o Bitcoin porque muita gente usa o Bitcoin. Se apenas 3 pessoas o usassem, bastariam 2 para o controlar. Em algumas moedas, menos divulgadas, existem essas 2, ou pouco mais pessoas, com capacidade para tomar decisões unilaterais.
  3. Todas as moedas que são minted e staked provocam uma inflação do número de moedas que contraria a escassez essencial ao valor. Quando uma moeda Staked pode ser transacionada na sua forma “st”, permite-se a duplicação do número de moedas em circulação, num processo de inflação monetária em tudo semelhante ao “ouro de papel” que retira ao ouro o seu valor monetário. 
  4. Muitos contratos existem para gerir contratos, que fazem contratos, numa pescada de rabo-da-boca que não acrescenta valor nem utilidade. Moedas que servem para trocar moedas, para aplicar em moedas e ganhar novas moedas, não é uma economia saudável. Para o dinheiro valer, tem de ser aplicado em coisas para além de trocar por dinheiro.

Em resumo, as criptomoedas sofrem de umbiguismo. Típico de inovadores focados na tecnologia, por momentos, na euforia, ficou esquecida a necessidade de fazer mais barato do que o sistema bancário tradicional e foi-se atrás de soluções extremamente complexas que simplesmente não são mais eficientes do que aquelas que já existem, não acrescentam valor e por isso, não podem ter grande futuro.

Para complicar, os bancos conseguem obter dinheiro de graça junto do banco central, não há verdadeiramente forma de ser mais eficiente do que isso. Fica assim entendido as presentes dificuldades do mercado cripto. E também fica claro um bom caminho por onde se pode voltar a avançar.

O futuro das cripto está então em procurar as tais eficiências, em acrescentar valor, em fazer melhor do que faz o sistema bancário tradicional e, de uma forma simples e barata. Tudo isso se consegue ao levar serviços bancários até a quem não acede aos bancos, quem vive em países pobres e/ou com governos tiranos

Tranquilo. Em 2018 foi pior. A indústria está a melhorar, as criptomoedas são hoje muito mais utilizadas e úteis, com moedas que acrescentam funcionalidades e eficiência, onde os bancos tradicionais não conseguem chegar. Com tempo, irão voltar a focar-se no que importa, a prosperar e terão um futuro brilhante, será coisa bonita de ser ver, de meter no chinelo a maior corporação multinacional da actualidade.

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Henrique Agostinho

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