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Henrique Agostinho
Henrique Agostinho
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A Ilha de Tanna, no Vanuatu, Oceano Pacifico, é um lugar extremamente remoto que se manteve na idade da pedra, até meados do século XX. Isolada, sem contacto com o mundo exterior, os habitantes mal deram pelo passar dos tempos, até que a segunda guerra mundial, para eles a primeira global, impactou a pequena ilha, de uma forma até inesperada.

Foi cerca de duas décadas depois do fim da guerra, que novos visitantes à ilha, deram de conta com os incivilizados nativos em plena adoração de um novo deus, Tom Navy, para o qual construíram e adoravam simulações de pistas de aterrissagem aplanadas na areia, imitações de aviões feitos com canas e paus, e outros elementos decorativos, vagamente no formato de walkie talkies ou paraquedas.

Um pouco de investigação sobre o fenómeno, deu para descobrir quais tinham sido os fundamentos desta nova religião. Durante a segunda guerra mundial, os nativos da ilha de Tanna tinham sido premiados com várias oferendas dos céus, largados por aviões americanos, que estavam estacionados numa base militar improvisada numa ilha próxima.

Do ponto de vista dos militares, essas oferendas eram uma forma barata e eficaz de conquistar a simpatia dos nativos, evitando que estes reagissem mal à presença de uma força invasora, e quem sabe, acolher generosamente eventuais náufragos, vítimas dos combates aéreos, que fossem arrastados para aqueles lados.

Nesse aspecto funcionou, os habitantes da ilha ficaram tão impressionados e agradecidos que passaram a olhar para o céu, desejando por novos presentes e associando tudo de bom às silhuetas metálicas que viam a cortar as nuvens. Só que, o fim da guerra não foi bom para toda a gente. Enquanto os militares americanos voltaram vitoriosos e felizes para as suas casas, os nativos deram por si a olhar para o vazio no céu.

Não tardou muito tempo, para alguns elementos com mais iniciativa e mais carismáticos, chamarem a si a responsabilidade de criarem as condições para atrair de novo os generosos viajantes das nuvens. Convencendo assim os seus conterrâneos a construir réplicas das pistas de aterrissagem e até dos aviões que gostariam de ter de volta, num conjunto cada vez mais elaborado e sofisticado de rituais. Só que os aviões nunca mais voltaram.

Por mais que os ilhéus seguissem os conselhos dos seus sábios e construíssem pistas de aterrissagem, por mais que oferecessem o que tinham, para construir melhores réplicas dos aviões e radares, o desejado Tom Navy não voltou, muito menos deu presentes. Os paraquedas cheios de ofertas maravilhosas teimavam em não cair do céu.

Ao fim de algumas décadas, seria de esperar que o desânimo se instalasse. Afinal havia uma nova geração a crescer, sem nunca ter visto cair nada do céu. Mas o culto manteve-se forte, com os líderes das aldeias a exigir cada vez mais e melhores cerimónias de atração dos aviões, para obter cada vez mais do mesmo, nenhum resultado.

Esta história, chegou ao ocidente uns vinte anos depois da guerra terminada e depois da incredulidade inicial, a tentação de ridicularizar os inocentes nativos das ilhas do pacífico, esbarrou com a constatação que o fenómeno, agora chamado de Cargo Cult, não era assim tão invulgar.

Para além das ilhas remotas que se deixavam impressionar pelo contacto com civilizações mais avançadas, a mentalidade do Cargo Cult não se poderia dizer estar completamente ausente do mundo moderno, de algumas religiões mais estabelecidas, ou nem sequer, e foi aí que a piada deixou de ser engraçada, daquilo que é vulgar chamar de Economia política.

Isso mesmo, as ideias que movem os governos, incluindo tudo o que se estuda nas universidades, as opiniões dos senhores importantes e especialistas, mais os seus mirabolantes planos para enriquecer as populações obrigando-os a pagar impostos, é, evidentemente, uma trapalhada sem fundamento, pior que o mais bizarro Cargo Cult das ilhas do pacífico.

As ideias peregrinas como combater inflação aumentando a despesa do estado, ou chamar investimento ao gasto do governo, ou dizer que os funcionários públicos pagam impostos, ou sustentar que dar trilhões para salvar os bancos fica barato, ou que dívidas são dinheiro e o Bitcoin não o é, são tretas tão absurdas, quanto será fazer uma réplica de avião com paus e canas e esperar que ele voe. Infelizmente os economistas ocidentais são muito mais caros.

A economia política, bem como muitas outras especialidades académicas, que se passeiam pelas televisões, não passam de um Cargo Cult. Uma fantochada sofisticada, onde uma cambada de gente que não tem a menor ideia de como pôr um avião a voar, não se coíbe de opinar sobre o que deve ser feito para que chova dinheiro do céu. Fazem-no por um módico preço, claro, que eles sempre recebem sobre a forma de subsídios e salários. Além de que, convém também notar que nunca se viu nenhum desses políticos ou académicos e especialistas, a aplicarem as suas ideias ao próprio dinheiro, acertam sempre em falhar com o dinheiro dos outros.

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Henrique Agostinho

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